sábado, 21 de fevereiro de 2015

Cronologia de um sorriso




Meus dentes permanentes nasceram tudo errado. Tinha dois dentões na frente, duas presas encavaladas, e um nascia escondido no céu da boca. Meu sorriso era confuso, literalmente.

Isso não me incomodava a ponto de chorar ou sair reclamando por aí. Mas um dia, na 5° série, o pirracento da turma contou para a professora que eu a tinha chamado de velha e ela revidou me chamando de dentuça na frente da sala toda. Depois desse episódio, tudo mudou. Cheguei em casa chorando pedindo pro meu pai me levar a um dentista, só que não contei o que havia acontecido na escola por sentir vergonha de ter chamado a professora daquele jeito. Sabia que ele ficaria decepcionado quando contasse essa parte, então, decidi sofrer calada.

Fui ao dentista e meses depois, estava usando aparelho. Não ousava imaginar que um dia pudesse ter um sorriso bonito, mas estava aliviada por poder esconder meus dentes atrás daquela grade de metal.

Na 6° série, da noite pro dia, todas as meninas da escola estavam de aparelho. Era a última moda e eu passei a ser apenas mais uma na multidão, o que me deixou muito feliz.

Porém, na 7°, 8°série, usar aparelho começou a significar ao negativo. Bom, pelo menos na minha cabeçinha. O assunto da vez era “quem ficou com quem”, e em uma dessas conversas, uma amiga confessou que tinha beijado um guri que usava aparelho e descreveu como “estranho”. –ESTRANHO COMO? Queria gritar angustiada, mas nem isso eu fiz. Minha timidez tomava proporções gigantescas, ainda mais nesses assuntos.

Resultado: só fui dar meu primeiro beijo aos 16 anos.

Também era época do orkut, e em uma das minhas muitas selfies diárias em frente ao espelho, comecei a me achar tão feia sorrindo que decidir parar. Toda vez que alguém anunciava uma fotografia, surgia uma Aline séria. Olhando essas fotos hoje, vejo que meu olhar sempre parecia meio triste...

Essas neuras passaram no colegial (ufa). Pode parecer clichê a resposta, mas a verdade é essa: a leitura realmente mudou a forma deu enxergar o mundo e, consequentemente, o meu mundo. Adquiri amor próprio, e até o fim da escola, eu ainda usava aparelho e estava bem com isso.

Uma semana antes de iniciar a faculdade, libertei meu sorriso de vez. Depois de tantos anos preso por grades físicas e psicológicas, tirar o aparelho foi o ápice da libertação. Hoje, sorrio para tudo e para todos e, às vezes, até fico em maus bocados por conta disso, rs.

Mas esse meu jeito não é porque não uso mais aparelho. É apenas o reflexo de quem eu sou hoje: alguém segura e feliz.

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